Atualmente, vivemos em um mundo BANI: frágil (Brittle), ansioso (Anxious), não linear (Non-linear) e incompreensível (Incomprehensible). Esse conceito foi criado em 2018, pelo futurista norte-americano Jamais Cascio.
Índice
Ele desenvolveu essa ideia para descrever dinâmicas e complexidades do mundo contemporâneo, substituindo o conceito anterior de VUCA (Volatilidade, Incerteza, Complexidade e Ambiguidade), que havia se tornado popular no final do século XX, para explicar o cenário de mudanças constantes e rápidas.
Com o passar das décadas nesse mundo em constante mudanças, muitas temáticas vieram sendo construídas, revisitadas e discutidas, tais como sustentabilidade, desenvolvimento sustentável, tecnologias emergentes, ESG e ODS’s, entre outras. Diante disso, surgiu a necessidade da adoção de práticas mais adaptativas, resilientes e inovadoras para alcançar resultados consistentes. ESG (Environmental, Social, and Governance) e ODSs (Objetivos de Desenvolvimento Sustentável) são conceitos inter-relacionados, mas não interdependentes. De maneira resumida, ESG refere-se a uma gestão baseada em critérios de responsabilidade empresarial, que avaliam o desempenho ambiental, social e de governança corporativa, surgindo inicialmente como foco de investidores na década de 2000, sendo amplamente conhecido após uma publicação construída entre o Pacto Global e o Banco Mundial. Já os ODSs são 17 objetivos estabelecidos pela ONU em 2015, parte da Agenda 2030, visando erradicar a pobreza, proteger o planeta e garantir a prosperidade para todos.
Os Sistemas de Gestão vêm evoluindo há décadas, acompanhando as também evoluções da revolução industrial e as mudanças que têm se apresentando no mundo. As normas ISO fornecem um guia relevante para implementar práticas de gestão eficazes nesse cenário. Mas será que continuam atualizadas diante de um cenário tão imprevisível e não linear? Você já pensou isso alguma vez?
Então, continue por aqui. Nesse artigo, vamos explorar como os princípios dessas normas se conectam com as demandas de um mundo BANI, ajudando as organizações a manterem a qualidade, segurança, responsabilidade social e sustentabilidade (alguns dos temas alinhados às práticas de ESG e dos ODS’s).
ISO 9001 e a Fragilidade do Mundo BANI
A ISO 9001 é uma norma internacional para gestão da qualidade, orientando as organizações a melhorarem continuamente seus processos para atender às necessidades dos clientes. No mundo BANI, onde a fragilidade é uma característica comum, as estruturas que parecem estáveis podem se quebrar rapidamente devido a fatores inesperados.
Para melhorar o desempenho das organizações e reduzir a fragilidade em processos e operações, a ISO 9001 propõe algumas práticas como:
- Gestão de Riscos e Oportunidades: A norma incentiva as organizações a identificar riscos e oportunidades de melhoria. Como Deming, um dos maiores pensadores da qualidade, afirmou: “Não se gerencia o que não se mede.” Nesse sentido, uma gestão de riscos eficiente ajuda a prever falhas e a responder rapidamente às mudanças inesperadas do mundo BANI.
- Foco no Cliente: A norma reforça a importância de entender as necessidades e expectativas dos clientes, algo crítico em um ambiente ansioso, onde as demandas mudam rapidamente.
- Melhoria Contínua: Nesse mundo, onde os resultados não seguem uma sequência previsível, que é não linear, a melhoria contínua é uma ferramenta poderosa para adaptar rapidamente processos e produtos às novas realidades. O princípio de Kaizen, que também se alinha à ISO 9001, propõe melhorias pequenas, mas constantes, para manter a organização competitiva e adaptável.
ISO 45001 e o Combate à Ansiedade no Ambiente de Trabalho
A ISO 45001, focada na saúde e segurança ocupacional, é muito importante para proteger os trabalhadores e promover um ambiente de trabalho seguro. Em um mundo ansioso, a saúde mental dos colaboradores é tão importante quanto a segurança física.
Para abordar esse aspecto no contexto BANI, a ISO 45001 algumas práticas como:
- Avaliação de Riscos à Saúde Mental: Além de identificar riscos físicos, a norma incentiva a avaliação de fatores que possam causar estresse e ansiedade, como jornadas de trabalho desorganizadas ou incertezas econômicas. Isso é crucial para ajudar os trabalhadores a se sentirem mais seguros e menos ansiosos, aumentando a produtividade e o engajamento.
- Participação Ativa dos Trabalhadores: Peter Drucker escreveu, “a cultura organizacional come a estratégia no café da manhã”, reforçando a importância de uma cultura inclusiva para o sucesso das organizações. Isso confirma a importância dos colaboradores se sentirem parte das soluções para os problemas da organização. A ISO 45001 enfatiza o envolvimento ativo dos trabalhadores no processo de gestão de segurança, o que reduz o estresse e promove um senso de pertencimento.
- Resiliência Operacional: Em mundo BANI, crises inesperadas podem surgir a qualquer momento, sendo assim, preparar a equipe para agir rapidamente em emergências é uma prática que aumenta a resiliência organizacional.
ISO 16001 e a Responsabilidade Social em um Mundo Incompreensível
A ISO 16001 aborda a responsabilidade social das organizações, uma questão crucial no mundo BANI, onde a sociedade está mais sensível às ações das empresas e às suas consequências. A responsabilidade social não é apenas uma obrigação ética, mas também uma forma de criar confiança e se destacar em um mercado competitivo e incompreensível.
A ISO 16001 e a ISO 26000 são normas que tratam da responsabilidade social, mas com enfoques diferentes. A ISO 26000, publicada em 2010, é uma norma internacional de diretrizes, não certificável, que abrange princípios amplos de responsabilidade social, como ética, direitos humanos, práticas trabalhistas e desenvolvimento sustentável. A ISO 16001 é uma norma brasileira que estabelece requisitos específicos para implementar um sistema de gestão da responsabilidade social, sendo certificável. A relação entre elas está na complementaridade: enquanto a ISO 26000 oferece um guia para boas práticas sociais de maneira mais abrangente, a ISO 16001 foca na estruturação prática e mensuração dessas práticas dentro das organizações. Juntas, elas promovem uma gestão mais responsável, alinhando estratégias empresariais com valores sociais e ético
Para implementar práticas de responsabilidade social, a ISO 16001 incentiva a adoção de algumas práticas como:
- Transparência e Ética: No ambiente BANI, a comunicação clara e ética é essencial para manter a confiança dos stakeholders. Segundo Philip Kotler, “a confiança é a moeda mais valiosa do marketing”, mostrando que a transparência é um diferencial competitivo.
- Engajamento Comunitário: A norma enfatiza o papel das empresas no desenvolvimento das comunidades onde atuam. No mundo BANI, isso é fundamental para criar laços de confiança, já que as expectativas sociais mudam rapidamente e muitas vezes de maneira não linear.
- Avaliação de Impactos: A ISO 16001 demanda que as organizações avaliem o impacto de suas atividades na sociedade, ajustando suas práticas para mitigar efeitos negativos. Em um ambiente onde as consequências das ações nem sempre são previsíveis, essa prática é essencial para uma gestão eficaz e consciente.
ISO 14001 e a Sustentabilidade em um Mundo Não Linear
A ISO 14001 é focada na gestão ambiental, relacionada a aspectos centrais no mundo BANI, onde os desafios ambientais se tornam mais complexos e imprevisíveis. Essa norma ajuda as organizações a lidar com a não linearidade dos impactos ambientais, promovendo práticas mais sustentáveis e adaptáveis.
Para alcançar uma gestão ambiental eficaz no mundo BANI, a ISO 14001 algumas práticas como:
- Gestão de Riscos Ambientais: A norma incentiva as organizações a identificar e mitigar riscos ambientais de forma proativa. Isso é fundamental em um mundo onde as mudanças climáticas e os desastres naturais são imprevisíveis e podem afetar negativamente os negócios.
- Uso Eficiente de Recursos: As práticas sustentáveis demandam um uso mais racional dos recursos, algo que a ISO 14001 enfatiza. Em um ambiente frágil, onde o acesso a recursos pode ser interrompido de forma inesperada, por exemplo, o uso consciente e eficiente é uma forma de garantir a resiliência organizacional, além de diminuir os impactos ambientais.
- Inovação para Sustentabilidade: A norma incentiva a inovação em práticas sustentáveis, essencial em um ambiente não linear, onde as soluções tradicionais muitas vezes não são suficientes. Fatores como economia circular, energias renováveis e tecnologias de baixo impacto ambiental são exemplos de como as empresas podem se preparar para os desafios do futuro.
Conclusão
As práticas de gestão descritas nas normas ISO 9001, 45001, 16001 e 14001 não são contraditórias ao mundo BANI e são importantes para garantir a qualidade, a segurança, a responsabilidade social e a sustentabilidade das organizações. No entanto, é preciso adotar uma abordagem mais flexível e inovadora, integrando práticas adaptativas que possam responder rapidamente às mudanças imprevisíveis.
Estas não são as únicas normas relevantes a serem adotadas pelas organizações, mas são as mais comuns quando trabalhadas de forma integrada num sistema de gestão. Igualmente, não são as únicas alinhadas aos temas mencionados, tais como ODS, tecnologias emergentes, ESG, entre outros. Na verdade, tem muito mais coisa que pode ser trabalhada e outras normas com afinidade ao que foi apresentado nesse artigo ou que pode ser integrada no sistema de gestão. Mas espero que o que você leu tenha servido para refletir que, mesmo num ambiente de mudanças, é importante adotar práticas de planejamento, mapeamento, controles, monitoramento, medição, padronização, entre outras características das normas citadas. Dessa forma é possível concluir que há sinergia entre essas normas e o mundo BANI, sendo demandado apenas que as organizações estudem como fazer isso acontecer para obterem os melhores resultados. E também é importante mencionar que as práticas apresentadas para uma ou outra norma algumas vezes podem ser comuns a mais de uma norma, variando apenas o seu objetivo central.
As normas ISO não são apenas requisitos a serem seguidos, mas ferramentas que, se bem aplicadas, podem transformar a maneira como as empresas enfrentam as complexidades de um mundo cada vez mais incerto e desafiador. Como disse Peter Drucker:
“Em tempos de turbulência, o maior perigo não é a turbulência em si, mas agir com a lógica de ontem.”
Portanto, cabe aos gestores aplicarem essas normas com uma mentalidade inovadora e adaptativa, preparando suas organizações não apenas para sobreviver, mas para prosperar em um mundo BANI.
Compartilhe via
Profissional com mais de 20 anos de experiência nas áreas de qualidade, planejamento e gestão, realizando atividades necessárias para implantação e manutenção de sistemas de gestão, tais como: diagnósticos, auditorias, treinamentos, estudos de casos, criação e monitoramento de KPI's, criação e acompanhamento de times multidisciplinares, análise e tratamento de problemas, mapeamento, design e padronização de processos, projetos de melhoria, implantação de normas técnicas e exigências legais, entre outras.
2 comments